Sob o comando de uma nova diretoria, liderada por Brenno Spiinelli, o Comercial procura resgatar a credibilidade e a força no futebol que marcam seu passado
Depois de um ano bastante tumultuado, o Comercial começa a se preparar para 2016 com o objetivo de voltar a figurar na elite do futebol paulista. Para isso, o Leão do Norte precisa começar quase do zero, lá da Série A3, o equivalente à terceira divisão. Nessa caminhada, o atual presidente Brenno Spinelli, aposta no apoio da torcida para recolocar o Clube nos holofotes.
Nesta entrevista, realizada pelo ex-dirigente e presidente comercialino entre 1997 e 1998, João Batista Campos, Spinelli conta como tem sido os primeiros meses do trabalho de reconstrução da imagem do time frente aos torcedores, e também à Federação Paulista de Futebol (FPF), já que o atual mandatário, que também tem experiência anterior no comando do Clube — no fim dos anos 1970 —, acredita que o Comercial, por ser um dos grandes do interior, precisa manter relação estreita com os cartolas da federação e com as equipes que disputarão a mesma divisão que o Bafo em 2016.
Spinelli também comenta sobre as contratações, como a definição de Alexandre Ferreira para comandar o time do banco de reservas, sobre os reforços para as competições que o Clube tem pela frente e sobre o olhar especial destinado às categorias de base, que Brenno pretende transformar novamente em um celeiro de craques.
João: Que trabalho a atual diretoria está fazendo para recuperar a credibilidade do Comercial?
Brenno: O Comercial está focado em reestabelecer a credibilidade junto ao comércio e às empresas de Ribeirão Preto, e também junto a Federação Paulista de Futebol (FPF). Nos últimos tempos, o Clube foi muito judiado, o Comercial teve a sua credibilidade comprometida. Para contornar a situação, nossa diretoria está contando com a colaboração de ex-presidentes — você, inclusive, porque tem ajudado bastante. Temos procurado reestabelecer a confiabilidade do Comercial junto aos órgãos competentes, assim como com a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), com a qual sempre mantemos contato. O Comercial é um dos grandes do Campeonato Paulista da Série A3. Vamos disputar um campeonato estadual com moral e confiança, não só dos nossos funcionários e torcedores, mas também com o respeito dos outros clubes pelo nome e pela tradição do Comercial. Esperamos fazer um bom campeonato e, para isso, é necessário ter credibilidade, o que temos conseguido justamente por causa do trabalho dos conselheiros, ex-dirigentes e, em especial, da torcida, a grande razão de ser do Clube. É importante se tornar sócio-torcedor para aumentar nossa capacidade de gerir e de estimular essa diretoria.
João: Diante de uma situação totalmente adversa, de recuperação e falta de dinheiro, como pretende tocar o Comercial?
Brenno: A resposta é o que estamos fazendo desde o início desta gestão (iniciada no dia 19 de agosto) que é um grupo de apoio, constituído por 20 empresas de comercialinos, que vieram como torcedores, e não como empresários. Esse grupo prevê cotas de participação que devem dar sustentação ao futebol. Temos outras fontes de receita, como aluguéis, contribuição do associado, sócio-torcedor e conselheiro, que servem para manter a parte administrativa. Agradeço inclusive a você, João, por ter nos dado esse apoio na formatação deste plano. Com isso, vamos ter a sustentabilidade necessária para tocar o campeonato a contento e, se Deus quiser, conseguiremos esse acesso.
João: Qual o posicionamento que o Comercial se coloca entre os outros clubes da A3?
Brenno: O Comercial é um dos clubes mais tradicionais do interior que está de passagem pela Série A3. Somos um time de primeira divisão que, circunstancialmente, em função de desmandos administrativos e funcionais, acabou ficando nesta situação. Exercemos uma certa liderança, sem dúvida, e a tendência é fazer com que os outros clubes se unam e procurem reivindicar o melhor possível para a competição. Isso é um trabalho de conscientização, de união. Dentro do Comercial, a união é muito importante, como também nos outros clubes que participam do campeonato. A rivalidade deve ser dentro do campo, procurando os pontos necessários, ganhando jogos. Já na formatação do campeonato, devemos ter sintonia.
Brenno: É esse o caminho. Tudo está sendo feito nesse sentido. Temos que dividir essa responsabilidade com a torcida e, para isso, lançamos nosso sócio-torcedor. Nas primeiras semanas, já tivemos uma adesão de mais de 600 torcedores, o que precisa aumentar. Em outros tempos, o Comercial teve mais de 4,8 mil sócios-torcedores, e esperamos chegar a esse patamar. O programa traz contribuições diversas, com inúmeras vantagens na loja e nos ingressos das partidas, além da rede de conveniados, com descontos no comércio e na prestação de serviços da cidade. São ofertas em laboratório de análises, colégios, restaurantes, bares, farmácias e muitas outras empresas. Hoje, temos uma rede de conveniados de mais de 100 estabelecimentos. Vale ressaltar que a vantagem principal é que o torcedor poderá ter o orgulho de colaborar com o ressurgimento do Comercial. Nosso objetivo é, rigorosamente, crescer e voltar para elite do futebol paulista e brasileiro, porque, no nosso tempo [anos 1970 e 1980], disputámos campeonatos nacionais. Isso depende da participação de cada um.
João: O que está sendo feito em relação aos compromissos assumidos pela gestão de Nelson Lacerda, deixados para essa diretoria?
Brenno: É oportuno mencionar essa questão porque, na assunção de nossa administração, estabelecemos um marco histórico e um marco administrativo. O que ficou para trás é de responsabilidade da gestão Lacerda, que são investimentos e contratações feitas em nome da empresa que administrava o Comercial. A partir da nossa entrada, os compromissos estão sendo tratados rigorosamente em dia. Os salários dos funcionários estão em dia, os impostos, os tributos, as taxas, enfim, tudo que nós temos de pagar de obrigação do Comercial está sendo cumprido. O que passou é de responsabilidade da empresa que fazia a gestão —nós já fizemos as medidas judiciais cabíveis, buscando, justamente, a cobrança desses valores passados e o ressarcimento do Comercial pelos anos causados com multa contratual. Isso pode demorar o tempo que for, mas será cobrado na justiça.
João: Voltando ao futebol, o que será feito daqui até o início do campeonato Paulista da Série A3, no dia 28 de janeiro?
Brenno: Estamos buscando o máximo de qualidade possível nas contratações, com muita pesquisa sobre cada um dos atletas, procurando saber todas as características, especialmente técnicas, físicas e até do caráter dos jogadores. Além disso, temos jogadores da base que deverão ser integrados ao profissional. Todos serão avaliados, inclusive os novos contratados — que podem ter o contrato rompido caso não correspondam às expectativas. O importante é a qualidade que estamos buscando. Não vamos medir esforços para montar um time que, além de técnica e preparo físico, tenha comprometimento com o projeto de buscar a qualificação do Comercial. Haverá muita cobrança nesse sentido e, para isso, vamos cumprir nossas obrigações. O Comercial foi muito mal visto no passado por não pagar os salários dos atletas em dia, por exemplo. Por isso, estamos procurando o grupo de apoio, para que tenhamos plenas condições de sustentar a equipe. Vamos plantar conforto, condições de viagem e alojamento adequadas, salários em dia para que possamos recuperar a credibilidade. Isso dá o incentivo necessário aos jogadores e que saibam que estão sendo buscados por seu nível técnico, por sua capacidade. Todos esses jogadores estão sendo buscados desta forma, sem influência de empresário. As contratações estão sendo feitas com compromisso de toda a diretoria, do treinador e da comissão técnica.
João: No início de 2015, vimos a movimentação do presidente do conselho, Davi Isaac, cuidando da formação de base no Comercial Futebol Clube. Como você tem visto a possibilidade do aproveitamento de jogadores formados no clube?
Brenno: Tem muitos jogadores de valor no Comercial. Mesmo que eles ainda não tenham plena condição de envergar a camisa de clube profissional, continuarão tendo as oportunidades. O campeonato é árduo e não podemos brincar e colocar um jogador que não tem amadurecimento suficiente em campo. Caso isso não esteja consolidado, esses jogadores serão mantidos dentro do Comercial e, principalmente agora, terão avaliada a sua real condição e maturidade, tanto técnica quanto pessoal, para disputar o Campeonato Paulista. Aqueles que demonstrarem essa capacidade, com certeza, serão introduzidos ao grupo. Hoje, temos jogadores na base que despertam interesse de várias agremiações. Temos atletas participando de negociações com o Fluminense, outros na Europa — como o Igor Carioca, que está jogando na Grécia, com uma expectativa muito boa de uma contratação por outro clube europeu. No ano passado, o Comercial teve suas categorias de base fatiadas — um time cuidado por uma empresa, outra categoria terceirizada para grupos de empresários, e assim por diante. Isso acabou. O Comercial assumiu todas as categorias, inclusive as escolinhas, que estão atraindo vários alunos novos. Também alugamos o Estádio Costa Coelho, da Mogiana, onde são desenvolvidos os trabalhos da escolinha. Esses jogadores que se destacam durante a formação, fatalmente, serão encaminhados para as categorias de base, e futuramente serão os craques do Comercial.
João: Os times que estão jogando também estão crescendo?
Brenno: Sim, estão melhorando e melhorarão muito mais no ano que vem porque os times de base sofrerão uma injeção de ânimo da direção. Queremos, realmente, fortificar a categoria de base com uma boa estrutura para esses jogadores se tornarem craques. O Comercial, faz tempo, não revela jogadores de renome: o atleta de qualidade sai antes de prestar serviço ao Clube. Então, vamos tentar aproveitar esses jogadores e fazer o melhor trabalho nas categorias de base.
João: Podemos transmitir para a torcida comercialina um futuro promissor?
Brenno: O envolvimento da torcida é muito importante, assim como o de ex-presidentes, que conquistaram a credibilidade e o respeito de todos. Mas o torcedor é a grande mola propulsora do time, o grande motivo de existir de um clube de futebol. Por isso mesmo, o torcedor sabe que o sucesso do Comercial depende da sua participação, do seu interesse, do seu prestígio, da sua confiança. Não vamos pedir mais paciência à torcida, nós vamos pedir confiança e, para isso, precisamos do respaldo e da participação de todos.
João: Em 2016, a Série A3 contará com muitos times de tradição, como Inter de Limeira, Matonense, São José, Noroeste, além de times com fortes investimentos, como o Grêmio Osasco. Essa vai ser a A3 mais difícil da história?
Brenno: Será difícil, muito dura. Por isso, estamos tendo tanto cuidado. Há clubes como esses, bem estruturados, e existem outros com condições mais limitadas, de acordo com os relatos dos próprios presidentes. Precisamos contar com muita estrutura. Talvez não sejamos os melhores, mas temos que acreditar nisso, trabalhando direito.
João: Como foi a escolha por Alexandre Ferreira?
Brenno: Desde o começo, essa era a nossa intenção. O Alexandre já estava envolvido em outro trabalho e, por uma questão de ética e até de respeito ao profissional, não quisemos tumultuar as coisas, e esperamos o momento certo para fazer a contratação. É um treinador que atendia a nossa filosofia, pela capacidade de organização, pela competência, por ser um estudioso, um pesquisador, um cara moderno. Não tínhamos a intenção de trazer um treinador já experiente e cheio de vícios na A3. Não temos que rotular um treinador ou um jogador dizendo que esse profissional é de A3, de A2 ou de A1. O principal é saber se ele é competente e comprometido com o projeto. Em se tratando do Ferreira, entendemos que ele é o profissional ideal para este momento do Comercial. Ser filho de um dos grande ídolos da história do Comercial, tendo também passado pelo Clube, foram fatores que somaram pontos positivos. Seu sangue alvinegro correndo nas veias certamente irá contribuir para o desempenho como treinador do Comercial. O que posso garantir é que ele terá todo apoio que pudermos dar, dentro de nossas condições.
PARTICIPAÇÃO DE TODOS
João Batista Campos, empresário
Brenno Spinelli e João Batista Campos
Texto: Leonardo Santos
Fotos: Ibraim Leão
Fonte: Revide
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